FAB, doação e transporte de órgãos

Publicado em por Amandina Morbeck em Cotidiano, Saúde
Trabalho conjunto da FAB com profissionais da saúde para coleta e transporte de órgãos - Foto: Reprodução.

Trabalho conjunto da FAB com profissionais da saúde para coleta e transporte de órgãos – Foto: Reprodução.

No dia primeiro deste mês (julho/2016), apenas 24 dias desde que o presidente interino Michel Temer assinou o decreto 8.783 de 6/6/2016 – que regulamentou a obrigatoriedade de a Força Aérea Brasileira (FAB) disponibilizar uma aeronave para transporte de órgãos para transplantes – foram realizadas 15 missões que transportaram 9 corações, 6 fígados e 2 pâncreas.

De acordo com o tenente Fábio Rodrigues Neves, que pilotou uma das aeronaves que saiu de Brasília, voos para coleta e transporte de órgãos têm prioridade nos procedimentos de tráfego aéreo, já que o fator tempo é essencial para o sucesso da operação, quando cada minuto realmente faz diferença. Daí a necessidade do transporte aéreo para vencer as distâncias e não desperdiçar um órgão que poderá salvar uma vida.

O coração, por exemplo, aguenta entre quatro horas e seis horas a partir da retirada do corpo do doador. Um tempo curto demais. O médico responsável pelo transplante é o que faz a retirada do(s) órgão(s), por isso o embarque dos profissionais da área de saúde é sempre a primeira parte da missão da FAB.

Sistema Nacional de Transplantes

O Sistema Nacional de Transplantes (SNT) brasileiro, vinculado ao Ministério da Saúde, coordena, regulamenta e normatiza os transplantes. Ele também é responsável por autorizar estabelecimentos de saúde e equipes especializadas para promover retiradas, transplantes ou enxertos de tecidos, de órgãos e de partes do corpo.

O SNT é totalmente articulado em nível nacional, embora com prioridade para o Estado no qual o doador reside. Por exemplo, se houver doador num Estado, mas não houver pacientes que precisem de seu(s) órgão(s) na região, o sistema permite o transporte do(s) órgão(s) para outro Estado para realização do transplante. Também pode acontecer de o recipiente, dependendo de suas condições físicas, viajar para fazer a cirurgia na cidade onde está o órgão disponível – lembrando: desde que não exista recipiente ou condição apropriada para o transplante naquele Estado.

A Central Nacional de Transplantes integra as organizações estaduais e seu objetivo é prover os meios para a transferência entre Estados e evitar desperdícios de órgãos. Ela funciona 24 horas por dia no Aeroporto de Brasília.

O Ministério da Saúde afirma que o Brasil tem o maior sistema público de transplantes do mundo, com 95% das cirurgias feitas no Sistema Único de Saúde (SUS). Perde apenas para os Estados Unidos, mas lá toda a logística é privada, ou seja, o paciente – com seus próprios recursos ou do seu plano de saúde – é responsável pela operação.

Tempo de espera

Não é novidade que o tempo de espera na fila de transplante pode ser muito longo. Dia 27 de setembro é o Dia Nacional de Doação de Órgãos, mas diariamente são mais de 70 mil esperançosos candidatos que, muitas vezes, morrem antes de ter uma segunda chance. Para fazer parte da lista, o médico precisa cadastrar o paciente/recipiente na lista única e ele precisa ser atendido e acompanhado por uma equipe médica de transplantes.

Depois disso, a separação acontece de acordo com as necessidades (conforme o órgão a ser transplantado), tipos sanguíneos e outras especificações técnicas. E quando surge um doador, seus dados são informados ao SNT via computador que, por meio de um programa que obedece a legislação brasileira para os transplantes, fornece a lista com os prováveis recipientes ordenados de acordo com o tempo de espera ou o grau de compatibilidade com o doador.

A lista única é ordenada cronologicamente e os recipientes são selecionados desse modo, mas com prioridade para a gravidade ou a compatibilidade sanguínea e genética com o doador. Assim, a distribuição de órgãos depende de outros critérios além do tempo na fila, variando conforme o órgão a ser transplantado.

O doutor José Medina Pestana explica: “Se o paciente é candidato ao transplante de fígado, o parâmetro será a gravidade da doença. Já no caso de doações de córnea ou pâncreas, por exemplo, quem recebe o transplante é o primeiro da fila. Assim que houver um doador, ele poderá fazer o transplante. Já quem precisa de rim irá depender da compatibilidade genética”.

Banner do Hospital Beneficência Portuguesa para estimular a doação de órgãos - Reprodução.

Banner do Hospital Beneficência Portuguesa para estimular a doação de órgãos – Reprodução.

Critérios para desempate

Quando há mais de um recipiente apto para receber um órgão, é preciso utilizar critérios para desempate, que são diferentes dependendo do tipo de órgão ou de tecido. Gravidade, por exemplo, tem alta prioridade ou atribuição de situação especial. Nesses casos, os pacientes passam na frente dos demais. Crianças têm prioridade se o doador também é criança ou se estão concorrendo com adultos.

Ser ou não ser doador

Ainda existe muito desconhecimento em relação à doação de órgãos. Para começar, todos podem ser doadores e não existe idade máxima para isso, o que não significa que os órgãos realmente poderão ser utilizados quando a pessoa morrer.

Além disso, é preciso autorização da família ou comprovação legal para que os órgãos sejam retirados após sua morte. Depois dessa etapa existem outras questões a ser consideradas. Confira:

  1. o doador não pode ter tido anteriormente ou no momento de sua morte qualquer doença que tenha danificado o órgão;
  2. via de regra, o doador não pode ter sido contaminado com vírus que provoquem hepatite, Aids e outras doenças. No entanto, se o recipiente tiver numa situação de muita gravidade, ele é notificado de que existe um órgão disponível, só que contaminado, e ele ou família (se ele não tiver condição de opinar) se quer recebê-lo ou não;
  3. o doador não pode ter tido câncer, ainda que esteja clinicamente curado;
  4. para a maioria dos órgãos é necessário que o doador (saudável) tenha morte encefálica* comprovada por repetidos testes realizados por médicos. É preciso manter os órgão irrigados, ou seja, vivos até a retirada pela equipe de transplante;
  5. quase ninguém menciona, mas pele e ossos também podem ser doados, independentemente de ter recipientes compatíveis no momento da retirada. Existem bancos de tecidos, de ossos e de medula. Transplante de pele, por exemplo, é fundamental no tratamento de quem sofre queimaduras.

Outras informações:

  • rim e uma parte do fígado podem ser doados a partir de doadores vivos – desde que comprovadamente saudáveis
  • córneas podem resistir a até sete dias a partir da retirada de um doador;
  • a pessoa pode optar por doar o corpo para estudo após sua morte.

*Morte encefálica: lesão irrecuperável do encéfalo (cérebro + tronco encefálico) – que comanda todas as atividades do corpo – por qualquer motivo. Sua morte é caracterizada pela inexistência de atividades encefálicas.


Depois do transplante, uma vida que resta mantida com a ajuda de medicamentos - Foto: Reprodução.

Depois do transplante, uma vida que resta mantida com a ajuda de medicamentos – Foto: Reprodução.

Nem todos os transplantes funcionam + efeitos colaterais

Mesmo com todos os procedimentos sendo religiosamente cumpridos, uma cirurgia bem-sucedida e o máximo de compatibilidade possível, infelizmente nem todos os transplantes funcionam. O risco de rejeição pelo corpo do recipiente pode ser muito forte e, mesmo com a administração de imunossupressores potentes, provocar sua morte.

Para os que sobrevivem, a vida nunca será igual ao que era antes. Certamente, será melhor do que o período que passaram doentes, mas a necessidade de tomar medicamentos fortes para controlar principalmente a rejeição, fará com que vivam num limbo no qual não são tecnicamente doentes, mas nem por isso realmente saudáveis. De qualquer forma, o transplante pode melhorar consideravelmente a qualidade de vida do recipiente.

De minha parte, todos sabem que quero ser doadora, pois mesmo depois de partir seria legal beneficiar uma ou mais pessoas com pedaços de matéria que serão desperdiçados e completamente inúteis para mim.

E você, o que pensa sobre isso?

Texto: Amandina Morbeck
(saiba sobre mim aqui)

(Para saber mais sobre esse assunto, acesse o site da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos.)

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