Embrulhar ou estuprar um presente?

Publicado em por Amandina Morbeck em Língua inglesa
Pronúncia em inglês: estuprar ou embrulhar um presente?

Que confusão por causa de um simples embrulho de presente! – Foto: Reprodução/Huffington Post.

Um erro de pronúncia e a confusão entre embrulhar ou estuprar um presente para minha professora de inglês.

Lá estava eu nos Estados Unidos, alugando um quarto na casa dela na cidade de Charlottesville, na Virgínia. De manhã, eu ia à escola, saía às 13h, almoçava e geralmente dava uma passada na biblioteca da Universidade da Virgínia para assistir a algum filme – para treinar meus ouvidos (listening and comprehension) – antes de fazer outras coisas.

Nesse dia, saí da biblioteca e fui comprar um CD para dar de presente para minha professora, pois era seu aniversário. Chegando em casa, a filha dela, Rebecca, estava com o namorado na sala, eu os cumprimentei e subi pro meu quarto. Mais tarde, me toquei que não havia comprado papel de presente. Como a casa ficava afastada da cidade, achei melhor ver com Rebecca se ela tinha algum. Abri o dicionário e procurei pelo verbo “embrulhar”. Achei “to wrap”, vi que eu precisava acrescentar “up” e desci para falar com ela.

Pedi licença e fiz a seguinte pergunta, com meu inglês naquela época ainda bemmacarrônico: “Rebecca, do you have any paper to rape up the CD for your mother?”  Ela e o namorado explodiram na gargalhada e não conseguiam parar. Fiquei onde estava, com cara de ué, olhando os dois dobrados de tanto rir. Ela tentava falar, mas não conseguia. Quando conseguiu se controlar um pouco, veio até a mim e perguntou se eu tinha noção do que havia dito. E o que eu havia dito de tão engraçado assim se tudo o que eu queria era to rape up o presente da mãe dela?, repeti. Pronto, os dois gargalharam de novo.

Enquanto eles riam, subi, peguei o dicionário e desci para mostrar a ela o que eu havia achado. Bom, depois de algum tempo fiquei sabendo que o que eu havia dito foi: “Rebecca, você tem papel pra eu estuprar o presente de sua mãe?” Exatamente isso, estuprar em vez de embrulhar. Por quê? Simplesmente porque a pronúncia de wrap é, aportuguesadamente para você entender, “rép” e não “reip” (com “r” de “caipira”), como eu havia dito, que é a pronúncia de rape (estruprar).

(O CD que queria embrulhar era do grupo No Doubt com a música Don’t speak. Veja no vídeo abaixo.)

Corei, me desculpei rindo muito também e, desfeita a confusão, voltei pro quarto com o papel de presente, embrulhei o CD e peguei novamente o dicionário. Comparei os fonemas e vi que eles realmente eram diferentes, como Rebecca me mostrou (pois aqui no Brasil ninguém havia chamado minha atenção para essas nuances). Levava comigo a noção de que “quase tudo o que tem a letra ‘a’ em inglês é pronunciado como ‘ei’”, mas não mesmo!

Quando contei a história pra minha professora (que depois pediu que eu compartilhasse na sala de aula como exemplo do que os erros de pronúncia podem provocar), ela também morreu de rir e conversamos sobre esses “achismos” que o não nativo da língua inglesa traz. Naquela época, ela era professora de estrangeiros havia 14 anos e tinha muitas histórias para contar,  mas confessou que “estuprar um presente” foi a primeira vez.

Por vivências como essa – e outras ao longo de quase três anos vivendo no exterior – é que valorizo muito a boa pronúncia, pois por mais que você ache que tudo bem, que um errinho numa pronúncia não tem problema, como fazem crer alguns professores e algumas escolas, com o discurso de que o que vale é você transmitir sua mensagem, ela pode gerar muita confusão. Veja que não estou falando de sotaque, porque ele estará sempre presente e não é nenhum problema.

A maioria das minhas gafes aconteceu em companhia de pessoas amigas, mas houve situações em que a pessoa simplesmente virou as costas para mim e se foi, me deixando a falar pra ninguém.

Com relação a minha professora, muito além do fato de eu ser recém-chegada aos States com uma bagagem bem capenga de conhecimento da língua inglesa (embora aqui me dissessem que era “ótimo” e eu tenha “terminado vários livros”),  o mais importante foi que ela gostou do CD – No doubt, que tinha a música Don’t speak, que ela adorava. Mas talvez até hoje, passados esses anos, ela ainda se lembre desse “causo” todas as vezes que ouve essa música. Eu pelo menos nunca esqueci.

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Amandina Morbeck


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